Psicomotricidade

Vem comigo e eu mostro-te o meu mundo: Perturbação do Espectro do Autismo

A forma como cada um de nós vê o mundo é diferente. Isso quer dizer que eu vejo o mundo à minha imagem e semelhança e a minha amiga Maria verá o mundo com os seus olhos.


Todos os cérebros trabalham de forma diferente, controlando, a forma como cada um de nós integra, sente, comunica e aprende. E é por isso mesmo, que temos habilidades especiais diferentes uns dos outros. Já pensou qual poderá ser o seu <super poder>? Vamos fazer um exercício interessante. Convido a fechar os olhos por breves instantes e pensar em todas as coisas que faz que sente que é especial a fazer. Coloque as mãos no seu coração, acolha e sinta os seus pensamentos. 


Agora já de olhos abertos, pergunte ao seu filho/a e companheiro/companheira, qual é que eles acham que é o seu <super poder> e partilhem ideias sobre isso. E verá que ao longo desse dia ou até noutros momentos, poderão surgir mais ideias sobre isto e têm a possibilidade de incentivar as habilidades especiais uns dos outros, potenciando-as.


Os nossos sentidos, estão sempre e é mesmo sempre, a enviar informação para o nosso cérebro: sobre o meio ambiente e sobre as pessoas que estão à nossa volta. Quando o cérebro e os sentidos não estão a funcionar em sintonia, o cérebro pode sentir-se sobrecarregado e até mesmo confuso, interferindo na forma como vemos, sentimos e experienciamos o mundo. O que acontece na Perturbação do Espetro do Autismo (PEA), é que as ligações sinápticas ocorrem de uma forma que afeta os sentidos e como as crianças compreendem as situações, as interações e os momentos.


As ligações especiais que ocorrem dentro de um cérebro de uma criança com autismo, podem fazer com que por um lado, tenham dificuldades em atividades que são mais fáceis para a generalidade das crianças, como é o caso de fazer amigos, interagir ou de iniciar um jogo ou por outro lado, podem podem fazer com que tenham sucesso em tarefas que poderão ser interpretadas como mais difíceis pela maioria.


Com o crescente número de crianças a serem diagnosticadas com a Perturbação do Espectro do autismo ou a terem alguns indicadores nesse sentido, torna-se fundamental e útil aprender um pouco mais sobre este mundo e é por isso que partilho convosco algum daquele que é o meu conhecimento de estudo, de leitura e de experiência prática sobre esta temática.


A Perturbação do Espetro do Autismo é uma Perturbação do Neurodesenvolvimento, que se caracteriza por alterações ao nível da comunicação, da interação social e pela presença de padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades. Isto significa que, as áreas que são especializadas na aprendizagem social: o contacto visual e as respostas emocionais estão comprometidas e nesse sentido, as crianças com PEA não se sentem interessadas por experiências sociais e têm dificuldades ao nível da sua linguagem. Manifestam dificuldades em compreender o que são as experiências sociais, em particular aquelas que estão relacionadas com a aprendizagem e com a comunicação social.


A expressão das características que as crianças com PEA apresentam, podem ser bastante variáveis de criança para criança, sendo que poderão estar presentes algumas ao invés de outras e nem todas se manifestarem exatamente da mesma forma.


As crianças com Perturbação do Espectro do Autismo, são crianças geralmente muito visuais. Isto quer dizer que armazenam e assimilam a informação na sua mente, essencialmente através de imagens. Reparam e focam muito a sua atenção, em cores, sombras e movimentos. Analisam o aspeto das coisas, os detalhes visuais dos objetos e colocam-nos em posições diferentes para uma percepção mais profunda. Uma das formas de observarem com mais clareza, é alinharem os objetos, colocando-os em perspectivas diferentes e elaborando assim uma imagem mental dos mesmos.


São vários os estudos, que mostram que as crianças com autismo estão conectadas emocionalmente com os seus pais e outros familiares de referência e que são significativos para elas e para o seu desenvolvimento. O que acontece relativamente à generalidade das crianças neurotípicas, é que poderão fazer demonstrações diferentes dessa mesma conexão e é aí que nós adultos, poderemos entrar no seu mundo e procurar compreender as suas reações, interações, interesses e necessidades.


6 Desafios de aprendizagem que estão associados ao autismo:


Os desafios de aprendizagem que aparecem associados ao autismo, poderão ser variados. Partilho convosco de seguida, aqueles que são os 6 desafios mais comuns:


  1. Atenção: as crianças com PEA têm a tendência de focar mais a sua atenção em objetos dos seu interesse, em luzes, cores, sombras e padrões, do que às expressões, gestos e palavras das crianças e dos adultos que estão à sua volta.
  2. Socialização: preferencialmente, as crianças com PEA preferem passar o seu tempo sozinhas do que a explorar as interações com os pares e a partilhar experiências com eles. Poderão aproximar-se e brincar próximo deles, mas não participarem na brincadeira, ou não os incluirem na sua brincadeira.
  3. Utilização de gestos de comunicação: é desafiante para as crianças com PEA utilizar gestos comunicativos nas trocas de partilhas de experiências entre elas e as restantes crianças ou adultos.
  4. Imitação: em situações em que podem surgir atividades de imitação, as crianças com PEA não sentem o impulso ou a vontade espontânea de imitar os gestos, sons ou os movimentos dos outros.
  5. Brincar com brinquedos: na generalidade dos casos, as crianças com PEA, focam-se em objetos específicos do seu interesse e repetem a mesma ação de forma padronizada e repetitiva, sendo que poderão ficar angustiadas ou frustradas se e quando são interrompidas. Têm vontade de brincar mais sozinhas com objetos do que com outras crianças.
  6. Estímulos sensoriais: as crianças com PEA podem ser sensíveis ao toque, a sons, a luzes ou a texturas ou por outro lado, podem ser facilmente estimuláveis nesse sentido.

 

COMO É QUE EU POSSO INTERAGIR COM O MEU FILHO COM PEA E REFORÇAR A SUA APRENDIZAGEM?

“Se nós imitarmos as crianças e nos envolvermos nos movimentos, gestos e ações que estão a realizar, com respeito pelo espaço, pelo tempo e pela dinâmica que estão a desenvolver, com tranquilidade no processo, a aceitação vai naturalmente acontecer aos poucos e as brincadeiras vão-se desenvolvendo e novas atividades vão surgindo.”

 

 


Dinâmicas e interações familiares que envolvam o toque e a contenção, contribuem para uma conexão e interação familiar e para que ocorra uma regulação em momentos de desafio. O convite principal é para darem abraços demorados, rebolarem enrolados numa manta, balançarem o corpo num lençol, fazer o efeito “sandwich” e fazerem de múmia. Vão ser momentos divertidos e que vão contribuir para a ligação afetiva e as aprendizagens posteriores.


Uma das melhores formas da conexão entre pais e crianças é através da sincronização, que se pode traduzir em movimentos e vibrações em espelho, através de atividades de imitação


Se nós imitarmos as crianças e nos envolvermos nos movimentos, gestos e ações que estão a realizar, com respeito pelo espaço, pelo tempo e pela dinâmica que estão a desenvolver, com tranquilidade no processo, a aceitação vai naturalmente acontecer aos poucos e as brincadeiras vão-se desenvolvendo e novas atividades vão surgindo. A determinada altura, já serei eu, adulta, a sugerir ou a iniciar uma atividade e a criança a imitar-me e nesta troca, a magia acontece. Eu vejo o outro como ele é, aceito-o e ele vê-me e aceita-me na nossa interação e as trocas surgem de forma mais natural.


Neste sentido, primeiro posso ser eu a acompanhar as brincadeiras, imitando e depois liderar e depois acompanhar e depois liderar. Lembrem-se: de aproveitarem e se divertirem ao máximo, porque afinal de contas, o mais importante de tudo é a conexão e o entendimento.


Imitar os sons dos carros e dos comboios, ao mesmo tempo que estão a ser utilizados, associando o som à palavra, pode ser bem divertido. Explorar ritmos diferentes, tamanhos e cores variadas. E para intercalar, podemos imitar os sons dos animais e associar a ação correspondente. Ou então podemos jogar à escondidas dos objetos, que colocamos dentro de uma caixa e que temos de adivinhar. Imaginem o que estará lá dentro. De que tamanho será? Fará barulho quando o tirarmos de surpresa? O que vamos esconder a seguir? E ao mesmo tempo, fazermos sons associados de suspense e de alegria.


Quando formos tratar da nossa higiene, também podemos fazer uma atividade muito gira, que é fazer caretas ao espelho e promover a imitação, ou até tocar em diferentes partes do corpo e imaginarmos que somos umas marionetas.


As crianças com Autismo veem o mundo de uma forma diferente e poderão partilhar connosco a forma especial como o veem, se nós também investirmos tempo, respeito e aceitação nesta relação.

 

Todos os elementos da família pode ajudar as crianças com PEA, procurando chamar a sua atenção para as oportunidades de aprendizagem que consideram importantes, proporcionando-lhes materiais e brinquedos que estimulam o seu desenvolvimento e que vão de encontro às competências que podem ser desenvolvidas na etapa em que se encontram. Uma forma que pode ajudar a chamar a atenção das crianças é falar e movimentar-se de forma exagerada, para que o tempo de foco aumente significativamente.


Uma relação feliz entre os pais e os filhos, de aceitação, de respeito e de acolhimento é a base para que as aprendizagens aconteçam e para que a comunicação se desenvolva.

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